domingo, 3 de março de 2013

PLANEJAMENTO OU FATALISMO?


PLANEJAMENTO OU FATALISMO?

 

                Através do planejamento o homem pretende arrancar o mistério do futuro, dominando-o mais efetivamente e enveredando por ele com certa segurança e esperança de êxito. Através do planejamento os homens pretendem solucionar em boa parte os grandes problemas que os afligem, tais como o analfabetismo, a doença, a fome, e o problema habitacional. Esta é a razão porque termos como "planejamento" e "previsão" exercem sobre o homem moderno uma atração mágica. Tudo ou quase tudo se espera desta nova tarefa que dia após dia adquire maior grau científico e que se afasta cada vez mais da mera adivinhação.         As viagens espaciais assombram-nos por causa da exatidão cronometrica de suas etapas, realizadas, praticamente, conforme previsão dos técnicos e dos cientistas.Neste campo,o planejamento encontra a sua máxima perfeição.Claro que tem muita gente que prefere ir pela fé ou por crença do que fazer estudo rigoroso.Tal comportamento já foi constatado por Franklin Deleno Roosevelt "Eu não vejo porque não existe maior entusiasmo pelo planejamento, exceto talvez por essa razão: que a palavra planejamento não anuncia algo muito espetacular sobre ela e leva bons vários anos para se ver os resultados dela."

            Aguçando a imaginação, talvez possamos esboçar o mundo fictício de amanhã, dirigido por uma nova raça de governantes, os planejadores, os quais se encarregarão de prever com a máxima exatidão as atividades humanas, desde as produtivas até as recreativas.

            O planejamento oferece-nos o futuro. Recuar essa oferta é colocar-se à margem da história, fora do corrente que leva ao progresso e à abundância.

            Neste mundo invadido pelo planejamento parece insolência agir por fatalismo e por crença do plano sobrenatural. Penso que mesmo que seja forte a cultura da crença no sobrenatural é preciso que ele tenha um mínimo de previsão para que não se veja envolvido por sérios problemas de saúde, de dinheiro e talvez até de moral. Se alguém se esquece de suas limitações e realiza esforços desmedidos, sem prever as consequências, ou então realiza investimentos superiores a sua renda mensal, ou ainda não seleciona seus amigos, imediatamente se dará conta de que sua conduta não é sábia, mas néscia. Esta é uma verdade no

terreno pessoal e muito mais, no terreno social.

            A nação que não toma medidas e planeja cuidadosamente os passos futuros, imediatamente se arrependerá de sua atitude ao ver-se confrontada com toneladas de problemas que bem poderiam ser resolvidos se tivessem sido previstos. de alguma maneira. Assim, por exemplo, se os países subdesenvolvidos tivessem planejado corretamente o seu campo educacional, não teriam hoje excesso de advogados e carência de engenheiros.Centenas e milhares de diplomados sem profissão para aplicar o que aprendeu na universidade.Que adianta formar doutores para navegarem num oceano de ignorantes. Sabemos que o planejamento é a negação da improvisação e um convite a disponibilidade.A palavra "disponibilidade" foi descrita pelo filósofo Gabriel Marcel como a virtude. que consiste em manter-se aberto para as novas possibilidades do futuro, as quais nunca podem ser previstas de antemão. A disponibilidade é a virtude do homem que sabe que não pode dominar totalmente o futuro e que está disposto a aceitar o que a vida lhe oferece. É graças à disponibilidade que o homem pode dar as boas-vindas a tudo que é novo, mesmo que isto modifique seus planos cuidadosamente elaborados. A disponibilidade é uma virtude, porque ensina ao homem que ele não é um ser perfeito e que jamais poderá saber com absoluta certeza o que o futuro lhe reserva. A disponibilidade torna o homem sábio, porque lhe ensina que a vida é mais rica, mais completa, mais misteriosa do que ele suponha; porque lhe ensina a superar com alegria os obstáculos que surgem. A disponibilidade prepara o homem para a felicidade, porque esta chega sempre de forma inesperada, repentina e sem planejamento. Não estar disposto a aceitar algo imprevisto, pode significar que a felicidade trazida por essa situação fique por nós desaproveitada. É comum que uma pessoa trace um plano de várias etapas sucessivas para cumprir em sua vida, como por exemplo estudar, formar-se, viajar para o exterior, procurar um emprego conveniente, casar-se, ter filhos. Quando isso acontece, falamos de uma pessoa prevenida, que alcançará o seu propósito, porque o planejou cuidadosamente. No entanto, pode acontecer, e frequentemente ocorre que as diferentes etapas que planejou para serem cumpridas em ordem determinada, sucedem em ordem diferente da anteriormente planejada. Se isto acontecer e a aceitar com humor, com alegria, então será uma pessoa com disponibilidade, porque aceita o novo jogo que a vida lhe apresenta. Por outro lado, se permanecer firme em seu plano, rejeitando a etapa que se antecede,expulsará também a felicidade inserida nela. Em última instância, a disponibilidade defende-nós das amarguras que podem provocar em nós um desejo irrealizável. Mas, disponibilidade não deve ser confundida de com resignação. A resignação limita-se em aceitar passivamente a situação. Isso provoca frustração. A disponibilidade, porém, aceita a situação com a esperança de alcançar, no futuro, riquezas não previstas. A pessoa resignada perdeu a esperança. O homem com disponibilidade não a perde, porque sabe que sempre se pode encontrar uma luz no meio das trevas; porque sabe que do tronco caído nascerá um renovo; porque sabe que alguém superior a ele sustenta-o.

            Neste mundo conquistado pelo planejamento, corremos o risco de perder a disponibilidade. O planejamento não é mau; é sumamente necessária sobretudo no terreno social e profissional. Mas, abusar do planejamento no terreno pessoal, pode-nos transformar em pessoas inflexíveis, pouco dispostas a tolerar novidades, capazes de se amargurar desmedidamente diante de qualquer contratempo não previsto.

 

                                Filósofo e Teólogo - professor de filosofia e história

 

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